Você já parou para pensar na palavra “cuidar”? O que ela significa para você?
Se você e outros leitores do site respondessem a essa pergunta, há grandes chances de aparecerem respostas variadas, porque a percepção de cuidado pode ter múltiplos sentidos.
O fato é que essa palavra acompanha nosso cotidiano. Às vezes, você presta o cuidado; em outras, você é cuidado, como também pode ocorrer de forma concomitante. Há uma relação de interdependência durante nossa vida.
Com o aumento da expectativa de vida, a presença do cuidado se estende aos novos anos que ganhamos. O envelhecimento da população, embora gere uma demanda crescente por cuidados, não deve negligenciar o fato de que muitos idosos assumem a responsabilidade de cuidar de outras gerações, como seus netos, proporcionando benefícios tanto econômicos quanto intergeracionais.
E quando o cuidado acontece entre idosos?
Com o envelhecimento populacional, torna-se cada vez mais comum encontrar pessoas idosas cuidando de alguém que tem mais de 60 anos de idade, como pais ou companheiros com algum nível de dependência.
Muitas vezes, essas pessoas idosas se tornam cuidadoras informais, sem conhecimento específico sobre o assunto. Isso pode tornar esse papel ainda mais desafiador.
Provavelmente, todos acertaram a resposta. Quem cuida mais são as mulheres. Esse papel tem sido associado às mulheres, seja no contexto do casamento, na maternidade ou no cuidado de outros familiares, como netos, pais, sogros ou tios.
Muitas vezes, a pessoa menos cuidada nessa história é a própria mulher, contribuindo para que o seu processo de envelhecimento seja com menor qualidade e oportunidades.
Isso precisa mudar. É imperativo que a sociedade, políticas, programas e empresas adotem uma postura mais inclusiva, mais “cuidadosa”. Esses agentes precisam cuidar de quem cuida.
Em 2016, ocorreu o “Encontro: Diálogo entre cuidadoras de idosos”, na Universidade de São Paulo (USP), mediado pelas gerontólogas Tássia Chiarelli e Glaucia Martins, na época vinculadas com o programa de mestrado em Gerontologia da instituição. Não foi digitado errado. O nome do evento utilizou a palavra “cuidadoras”, no feminino. Mesmo sendo aberto para o público em geral, mas considerando que a maior parte de quem cuida é mulher, o nome do encontro buscou gerar esse reconhecimento e visibilidade. Participaram cuidadoras e cuidadores formais e informais.
O evento proporcionou um espaço de escuta e diálogo, utilizando dinâmicas para facilitar a conversação. Rodas de conversa de diferentes tamanhos promoveram interações variadas.
Primeiro, de caráter mais intimista, os participantes foram divididos em grupos menores, sendo discutido um texto de apoio para facilitar o compartilhamento de experiências de cuidado. Em seguida, foi a vez da união; todos os pequenos grupos se transformaram em um único grande grupo para expandir as oportunidades de trocas.
Houve momentos de muita emoção, de choros, risadas, ideias e apoio.
No encontro citado, foram coletadas informações com os participantes sobre os desafios no cuidado. Os relatos destacam a necessidade de melhor compreensão sobre quem está sendo cuidado, a sobrecarga e as dificuldades que podem surgir no relacionamento familiar, como demonstrado nesses trechos:
“Em muitas circunstâncias abri mão da vida própria: compromissos, datas importantes, compromisso com a dependência dos cuidados básicos.”
“Manter equilíbrio emocional para suporte físico e mental que exige na atividade.”
“Em primeiro lugar o respeito e ter um bom relacionamento com a família.”
“Saber entender, ter paciência, ouvir, convencer a tomar banho, deixar feliz dia a dia.”
A falta de reconhecimento profissional e a ausência de apoio técnico e emocional foram questões abordadas. O chamado é por mais oportunidades de aprendizado, eventos de conscientização e regulamentação da profissão. Confira alguns relatos:
“Ter mais oportunidade pra pessoas que não podem pagar um curso. Amo o que faço.”
“Melhor e maior número de atividades para propagar conhecimento holístico necessário as atividades de cuidadores, além de ações voltadas ao cuidado da cuidadora.”
“Regulamentar a profissão, ter descanso como outra profissão e sempre reciclar com cursos.”
“Acompanhamento psicológico, palestras e encontros para dividir experiências.”
A mensagem final é clara: precisamos avançar. Mais oportunidades de escuta, educação, apoio e respeito são essenciais para quem cuida. A valorização profissional, o reconhecimento dos direitos e a garantia de dignidade são passos fundamentais para construir uma sociedade mais consciente e “cuidadosa” em relação àqueles que dedicam suas vidas ao cuidado do próximo.